A fé e a função libertadora


Quisera falar da fé católica sem parecer critica aos olhos dos homens, mas a verdade que perdura a séculos no catolicismo romano encontra no clero ortodoxo uma soma de indiferenças, capazes de submeter os homens às leis de um sacerdócio que em tempos de crise pouco influi para que a humanidade trace rumos menos hostis.

A exemplo, durante o horror do holocausto, o Vaticano fechou os olhos para a barbárie praticada por Hitler. Muito sangue derramado, contraposto ao silêncio fixava o perfil de uma teologia pouco comprometida em defender os homens dos infernos praticados pela ideologia nazista.

Há bem pouco tempo, devido às várias transformações que sobrevieram ao regime econômico em quase todos os países industrializados, inclusive no Brasil, a força sindical demandava a necessidade de regulamentação das condições de trabalho. Espremidos pelo avanço industrial, os trabalhadores do campo sofreram a ameaça de desvalorização da mão-de-obra agrícola, o que resultou, no período pré-golpista de 64 (também comum à Era Vargas), na organização das ligas camponesas, consideradas pela Igreja e pelo Estado como associações anticristãs, por, segundo suas concepções, serem impregnadas de idéias marxistas, e associadas à ideologia comunista. Dissidentes formadores de uma ala mais progressista, os padres engajados em movimentos de reformas sociais exigiam a extinção da pobreza e o fim da opressão, e assim inauguravam um novo caminho para a fé: a Teologia da Libertação, e eram muitas vezes sufocados pela Repressão ou pelos próprios preceitos de Roma. Algo que na atualidade ainda é alvo de críticas perante a Igreja, soerguendo entre católicos ortodoxos e progressistas uma dicotomia quanto à função social proporcionada pela fé.

Durante a visita do então Papa João Paulo II ao Brasil, datada do período da Ditadura, as ligas camponesas passaram a ter o sindicato católico como fonte de controle de suas atividades. Assim, Igreja e Estado fundiam, não só no Brasil, mas em todo pais da América Latina uma parceria de propósitos e de negociações.

Hodiernamente, a visita do Papa Bento XVI vem ao encontro de um brasil não muito diferente do Brasil de outrora - ainda atrasado e subdesenvolvido – porém, por ironia dos tempos, regido por um presidente oriundo da classe neo-proletária e com acentuada apropriação de idéias socialistas.

Em tom de reforço à manutenção dos princípios ortodoxos, Vossa Santidade apregoou proteção ao matrimônio, fidelidade, negação ao uso de preservativo, proibição do aborto e a manutenção da castidade como valores que precisam ser resgatados pelos seguidores da doutrina. Temas como a violência, a disseminação das drogas e da pobreza foram tratados apenas aos olhos da moral ortodoxa - que abole as intervenções na realidade mundana e proporciona, através do vínculo com o divino, o conforto necessário às inquietações humanas.

Da última visita papal aos dias atuais o Brasil não se modificou muito enquanto instituição cujo poder centraliza as características de uma estrutura de classes submetidas a uma elite de dominação. O que mudou foi o índice de miseráveis, triplicado em torno a uma política econômica covarde e à prática da cultura de exclusão. Sob este aspecto, o pronunciamento do Estado não tem como seguir os desígnios da fé e poderia a Igreja prestar uma contribuição importante para a erradicação da miséria e das injustiças sociais. Daí a importância da ala progressista que encontra em Deus uma função libertadora capaz de promover as transformações sociais e de reforçar o verdadeiro espírito de igualdade e de amor ao próximo.

Em pleno século XXI não parece possível que conformemos a fé a questões apenas relacionadas a uma moral cristã, é necessário aprimorar os desígnios divinos através de uma teologia mais libertadora e menos distante das misérias humanas.

O Estado laico proposto pelo presidente Lula não rompe com a fé, rompe com a conformação do espírito que além das orações não busca outra saída para que o pecado da fome e das misérias humanas sejam banidas da nossa realidade.

Embora respeitadas as manifestações individuais da fé, em defesa da Teologia da Libertação, os seus adeptos, como o padre Leonardo Boff, vem em ações muito mais contumazes trazer ao povo brasileiro o verdadeiro papel da crença e da devoção.

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