Irrascividade hedionda


O Jornal a Voz da Cidade vem solidarizar-se com todas as vítimas da violência e lançar uma profunda reflexão tomando como exemplo o trágico acontecimento que levou à morte o menino João Hélio, de seis anos, friamente assassinado por cinco rapazes no subúrbio do Rio.

O caso deixou de ocupar as estatísticas e chamou a atenção para uma problemática há muito convivente com a sociedade brasileira: a violência como máxima expressão da degeneração humana, fruto da diferença econômica e das disparidades políticas que acentuam uma cultura de desigualdade. É necessário acordar, pois o caso João Hélio demonstra que nossa organização social é falha, é incapaz de fornecer uma estrutura fomentadora do equilíbrio. E sem equilíbrio, a sociedade rompe o elo de harmonia entre seus indivíduos e as camadas sociais passam a configurar territórios isolados de disputas, hoje travadas para além da questão material que envolve o crime e a violência.

Sob muitas faces, o episódio se revela grave e envolve mais que uma vertente: põe em xeque as leis, a política de segurança pública, a falha dos sistemas criminais, a maioridade penal, o poder punitivo do estado, o efeito da desigualdade econômica e principalmente o aspecto decadente de um país em crise.

Sob muitos aspectos a morte do menino João nos deixa frente a frente com as nossas falhas, e é possível reconhecer aquilo o que a falta de autocrítica tenta omitir: somos todos, sociedade e Estado, contribuintes dessas tragédias cotidianas. O Estado por adiar reformas necessárias ao desenvolvimento e principalmente por acentuar as desigualdades entre os seus tutelados, e nós por configurarmos como indivíduos de exigências isoladas e emocionais - pagamos impostos ligados à segurança e nenhuma exigência é praticada para cobrar o retorno esperado.

Somos um povo sem pátria, sem frátria (como diria Caetano) e sem identidade, raras exceções, no futebol e no carnaval concentramos um pouco de ufanismo. As instituições por outro lado não se aproximam dos seus destinatários e recheadas de representantes omissos distanciam deveras os poderes – cegos demais para a justiça de fato. Banalizadora dos flagelos urbanos, a cultura de massa informa o caos institucionalizado, mas não opera o sentido do dever que a notícia exige tanto dos cidadãos quanto dos governantes.

Uma teia ideológica subverte valores e sabota o verdadeiro sentido, reforçando o repúdio às mazelas da pobreza enquanto reverenciamos padrões ricos e oprimentes. Inobstante, cavalgamos o ímpeto da vingança por vermos a justiça desacreditada. Da vingança nasce o ódio aos criminosos de baixa renda enquanto toleramos a impunidade das sentenças distribuídas a quem tem influência e poder econômico.

O menino João foi vítima de uma irrascividade hedionda, não justificada nem mesmo pela franca disseminação do subdesenvolvimento latino-americano.

Por mais que racionalizemos para além da barbárie, não existem isenções que comportem tamanha crueldade, ainda que as interpretações psico-sociológicas invistam numa adequação. A patologia do crime não isenta seus praticantes e não define de que classe social é oriunda. Dói, macera, tortura, mortifica e nos preenche de medo e revolta. Ricos ou pobres, seus adeptos oferecem um risco em potencial com requintes de frieza e crueldade.

A vergonha está no modo como o Brasil trata criminosos ricos e criminosos pobres. A própria justiça brasileira patrocina esta diferença – quem acompanhou o caso Susane Rieschtofen constatou o tratamento dispensado aos irmãos Cravinhos. Extirpar o mal pressupõe mexer em todo um sistema sobre o qual ainda não nos debruçamos. A cura, de fato, implica em sangrar o foco e limpar o pus dos alicerces institucionais.

Enquanto imperar o binômio impunidade-desigualdade as raízes do caos abastecerão a índole da maldade. Acrescente-se a este a corrupção, fortemente presente nas corporações das polícias, nos sistemas penitenciários, nos poderes, inclusive o judiciário e nas escalas dos governos que reforçam o comando nocivo e torpe de um país.

Embora a morte do menino João tenha alertado a sociedade para o problema da violência, devemos conduzir a discursão para além dos parâmetros da segurança pública, pois o tema envolve direitos e garantias fundamentais, além de reformas estruturais, que resvalam na democratização e na distribuição de renda.

Parece maçante reclamar a atenção para uma notícia nacionalmente veiculada, mas tendo o Jornal a Voz da Cidade o compromisso com a verdade jornalística, a análise a que submetemos o fato espera encontrar no olhar crítico do leitor a reação que nos exige a dura realidade.

Deflagramos um tema polêmico: segurança pública. Hoje temos em relação as nossas polícias a sensação de que toda a atuação, por mais bem treinada que seja, conta apenas com a sorte. Enfrentando uma luta desigual, nossos policiais, quando dignos de pertencerem às suas corporações, fazem o primado da defesa social sem o escopo do amparo que deveria lhes garantir o Estado. Sem salários dignos, submetidos a pressões diárias, sem acompanhamento psicológico ou táticas de inteligência para o combate ao crime, muitos ainda enfrentam com armas obsoletas a bandidagem bem armada. Há que se falar também na inteligência a serviço do crime. O perfil criminoso mudou de face. O crime hoje pensa, articula, conta com aliados poderosos e serve a um banquete estrategista, visando à auto-sobrevivência e à eliminação dos seus inimigos. Contando com a corrupção nos poderes, os “maus policiais” contaminam as corporações e fortalecem o reinado do crime.

Em oposição às escórias de toda a gama, existem os policiais sérios que transmitem sobretudo profissionalismo e confiança. É preciso reconhecer que estes ainda doam as suas vidas para impedir que o crime atinja as nossas. O resguardo policial é fundamental, mas contra o crime a guerra não deve ser apenas armada. A união entre a sociedade, as instituições e as táticas de políticas públicas talvez viabilizasse um caminho menos tardio e sangrento.

Cachoeiras enfrenta a violência e a criminalidade

Dentro dos liames da segurança pública está o dever de proteção e prevenção exercido pelas polícias militares, civis e federais.

Se a instituição estatal enfrenta graves problemas relacionados ao tema, não esperamos diferir da macro realidade. Aqui a nossa força policial exerce seu trabalho com ardis dificuldades, enfrentando a precariedade de todo um sistema que se estende também aos limites municipais.

Tendo que proteger uma área de 956,8 Km², nossos policiais militares hoje contam com poucas viaturas para atender à segurança municipal.

Com um contingente organizado, os policiais da 2ª Cia. do 11º Batalhão utilizam a criatividade para burlarem a insuficiência instrumental que também nos atinge.

Mesmo com um número limitado de viaturas, a atuação policial tem se mostrado eficiente e continuamente combativa. Em áreas consideradas mais críticas, onde há incidência de drogas e foco de criminalidade, a atuação policial exige um papel bem mais contundente e nestes pontos a presença policial tem sido ostensiva.

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